quinta-feira, 3 de junho de 2010

O Século da Curiosidade

“Você sabia que muçarela se escreve com ‘ç’?” Vive-se no século da Superinteressante. Nunca antes houve tanta informação à disposição de todos e nunca antes a informação foi tão rapidamente substituída por novas informações – surgidas a cada segundo e veiculadas quase imediatamente.

A maneira superficial como cada notícia é tratada pela mídia indica, obviamente, uma tendência clara à diminuição da qualidade em troca da velocidade. Além disso, destina-se (cada notícia) a um público acostumado às novidades, ao gradual aumento da violência e do sexo nas temáticas abordadas. Um público acostumado a olhar acidentes e a esperar – quase desejar – mortos, em número cada vez maior.

Esse mesmo público está sempre sedento por informação, conhecimento, mas um tipo especial de conhecimento: o rápido. Quer saber quanto tempo uma mosca leva para dar a volta ao mundo, mas não deseja entender os mecanismos que poderiam tornar a tal mosca apta a isso. Quer saber que se escreve “entrega em domicílio”, mas não quer entender por quê. Quer saber que na China se comem cachorros, e que isso é chocante, mas é tudo que deseja saber. O bastante para recontar aos outros, mostrar certo conhecimento especial que lhe garanta a atenção dos 15 minutos. E só.

Vive-se numa época em que a curiosidade – uma qualidade indiscutivelmente importante – voltou-se para a aquisição de qualquer informação inusitada, digerida e, muita vez, inútil. Por que isso aconteceu? Porque a mídia descobriu que, quanto mais inusitada ou curiosa for a informação, maior o tempo que o telespectador ficará disposto a vê-la. Entretanto, não pode ser por muito tempo, porque ele se cansa logo, então deve haver mais e mais curiosidades, acidentes, cacetadas, perseguições policiais (editadas, é claro), enfim, vídeos incríveis. Ou viagens a lugares distantes, com imagens lindas e uma narração bem melosa ao fundo.

Tudo isso contrasta com o outro fenômeno nacional, o BigBrother. Lá, a informação inexiste. Há a tediosa seqüência de brigas (simuladas, talvez) entre um grupo de pessoas rasas, vazias, plenamente conscientes de que estão submetidas a uma experiência e – diferente do que parece ter acontecido nas primeiras quatro ou cinco edições do programa – conscientes de que podem tentar manipular o público com o que chamam de “jogar”. A informação é substituída pelo desejo de saber curiosidades sobre cada um dos insossos participantes. Saber sobre a vida deles, acompanhar as intrigas de uma novela sobre a qual se tem poder (será?) de decidir sobre o destino das personagens : isso basta ao superinteressante público.

Obviamente, condenar esse público é ser injusto. Criou-se o público assim. Condicionou-se o público a, gradualmente, manter-se sedento por informações que se tornem polêmicas, interessantes, discutíveis. Superinteressantes. Para esse público, as apresentações feitas em PowerPoint garantem atenção. Circulam, por isso, várias com os também variados temas – veja como são as geleiras!, olhe os acidentes de trânsito!, seja gentil com as taturanas!

Mais ainda: vê-se a moda do conselhismo. Todos se acham autoridade sobre algum assunto, ao menos o bastante para enviar vídeos ou imagens que ordenem “faça isto ou aquilo” – ou, como já cantou Pitty, em Admirável Chip Novo, “Pense, fale, compre, beba\Leia, vote, não se esqueça\Use, seja, ouça, diga...”. Não é preciso informação real para produzir uma dessas apresentações, basta que se tenha um problema a se apresentar, uma boa dose de emoção e algum fundo musical. Suficiente para que seja infinitamente repassada às demais vítimas emocionadas com o que se fez.

A história da informação, no Brasil, caminha aos passos da Revista Superinteressante. Ou da Galileu, quem sabe? Houve um tempo em que essas revistas traziam matérias seríssimas, completas, ricas. Depois, voltaram-se para um público jovem, não para o público jovem. Um público jovem que só quer saber sobre curiosidades de um mundo estranho. Houve uma época em que havia páginas de texto e uma ou outra foto. E os textos eram excelentes. Hoje, há páginas de fotos e um ou outro texto. E as fotos são excelentes. Se uma foto vale mais que mil palavras... este é o caminho certo. Porque as pessoas aprenderam a não ler e a não pensar – mas admiram fotos.

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